Rodrigo Baptista | 12/05/2023, 09h24
Além do projeto da Lei Geral do Esporte, aprovado na terça-feira (9), outro tema que envolve competições esportivas recebeu a atenção de senadores nos últimos dias: a regulamentação das casas de apostas.
O assunto ganhou força com o avanço da Operação Penalidade Máxima, do Ministério Público de Goiás, que investiga um esquema de manipulação de jogos de futebol através de apostas esportivas.
Mesmo sem um projeto sobre o tema na pauta, parlamentares usaram o espaço do Plenário da Casa para criticar a interferência das apostas no futebol e apontar a necessidade de regulamentação do setor.
O debate foi puxado pelo senador Omar Aziz (PSD-AM) nas sessões de terça-feira (9), durante a votação do projeto da Lei Geral do Esporte (PL 1.
825/2022), e também na quarta-feira (11).
- Dificilmente você vê um brasileiro que não torce por algum time.
Mas se nós não tomarmos uma posição, o governo não tomar uma posição, o Congresso Nacional não tomar uma posição sobre essas apostas esportivas que estão tendo aí, vai acabar o futebol, porque estão comprando jogador e vão continuar comprando jogador de futebol.
Isso virou uma esculhambação geral - afirmou Omar na terça.
Autor de um projeto de lei sobre o tema, o senador Jorge Kajuru (PSB-GO) pediu, no mesmo dia, que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, desse andamento ao PL 845/2023.
O texto também é assinado por Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
A proposta prevê que a empresa de apostas tenha pelo menos uma filial no Brasil, pague R$ 20 milhões para uma autorização de cinco anos e recolha impostos devidos sobre as premiações.
Conforme o texto, a casa de apostas também terá que adotar medidas de prevenção do transtorno do jogo compulsivo e de proteção de menores de idade e idosos.
- Presidente Pacheco, nós temos que colocarmelhorcasa de apostapauta esse projeto nosso e dele a gente ser protagonista.
Não precisamos esperar o governo, que promete amelhorcasa de apostamedida provisória, só que nós não sabemos se ela vai ser completa como a nossa, se ela vai discutir todos os ângulos dessa questão - apontou Kajuru.
O governo federal tem discutido o envio de uma MP ao Congresso para regulamentar as casas de apostas.
No dia seguinte, Kajuru informou que Pacheco encaminhará a proposta à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
- A CCJ vai começar a fazer o papel dela.
Eu só queria acrescentar que a gente não pode ser radical.
Há empresários bem-intencionados que vieram até o meu gabinete, que querem pagar impostos.
O que eles alegam é que a forma como o ministro [da Fazenda, Fernando] Haddad colocou a licença de cada casa de aposta fica desproporcional, porque ele estabeleceu um valor de R$30 milhões para cada casa.
Eu fiz uma proposta ao ministro Haddad, ele aceitou o diálogo com esses empresários - relatou Kajuru.
Mas a tributação é apenas um dos aspectos a serem regulamentados, apontou Flávio Arns (PSB-PR).
- A questão é muito pior do que isso, porque crianças estão jogando, jovens estão jogando e nós não devemos aceitar simplesmente que paguem o imposto e continuem jogando, porque você está, na verdade, fazendo com que essas pessoas acabem se viciando no jogo.
Há corrupção envolvida nos jogos também - disse Arns.
Impactos sociais como vício e endividamento também preocupam outros senadores como Magno Malta (PL-ES) e Eduardo Girão (Novo-CE).
Girão relatou que foi abordado por um homem no Ceará que tem enfrentado sérios problemas depois que começou a apostar.
- Ele era evangélico, nunca colocou uma gota de álcool na boca e, por curiosidade, de tanto ver propaganda nos estádios, na televisão, aposta, aposta, aposta na camisa do time, aposta, aposta, aposta...
Esse cara perdeu tudo: 20 anos de trabalho na mesma empresa, 20 anos.
Todas as economias do FGTS foi lá e sacou, fez empréstimo, pegou dinheiro com a irmã e com a família.(...
) É uma tragédia social a que esta Casa precisa dar uma resposta - afirmou o parlamentar.
O senador Giordano (MDB-SP) considera fundamental ouvir os donos das casas de apostas o quanto antes.
- O povo brasileiro está se acabando de apostar, perdendo dinheiro, famílias perdendo dinheiro, e eu queria ver a possibilidade de a CAE convocar essas empresas para a gente ver onde são as sedes delas para, no mínimo, deixar a tributação aqui.
E outro problema: crianças jogando.
O que tem de criança jogando, adolescentes jogando, pedindo dinheiro do pai, cartão de crédito do pai, para ficar jogando...
A coisa desandou! Não tem regulamentação! - avaliou Giordano.
Impacto
Estudo da Consultoria Legislativa do Senado intitulado O Mercado de apostas On-line analisa os impactos e desafios para a regulamentação do setor e aponta que o mercado de apostas esportivas tem tido crescimento acelerado desde 2018 e vem atraindo um público cada vez mais jovem.
O levantamento destaca quemelhorcasa de apostapaíses onde esse mercado já é regulamentado, como no Reino Unido, além dos montantes significativos movimentados na economia, como tributos ou investimentos e contratações de profissionais, diversos outros aspectos são impactados,melhorcasa de apostaespecial, a saúde mental dos apostadores e a possibilidade de manipulação de jogos.
"Dessa forma, a realização de apostas esportivas continua autorizada no Brasil.
Contudo, a falta de regulamentação impede que esse mercado funcione corretamente, com abertura de empresas no país, arrecadação de impostos e proteção ao consumidor", destacam os consultores.
Funcionamento
As apostas esportivas funcionam com uma cota fixa: o lucro é calculado com base na cotação da aposta (as chamadas odds), que é multiplicada pelo montante investido.
É possível apostarmelhorcasa de apostadiferentes eventos que acontecem durante a partida como time vencedor, placar final, quantidade de gols marcados, além de número de escanteios, cartões, entre outras estatísticas.
As escolhas podem ser feitas direcionadas por jogador, por time, ou até por tempo de jogo.
De acordo com as investigações do Ministério Público, um grupo criminoso aliciava jogadores para que eles manipulassem situações de jogo como cartões e escanteios.
Com isso, os integrantes da organização garantem o resultado das suas apostas esportivas.
Legislação
Em dezembro de 2018, o então presidente Michel Temer (MDB) editou uma medida provisória que permitiu as apostas de cota fixa (como juridicamente é conhecida essa modalidade de apostas esportivas).
Convertida na Lei 13.
756, de 2018, a norma previa um prazo de dois anos (prorrogáveis por mais dois) para que houvesse a regulamentação do setor.
Em meio ao escândalo das apostas que tomou conta do futebol brasileiro e virou caso de polícia, há o Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR), organização que representa nove empresas do setor.
Em entrevista exclusiva à ESPN, o diretor-presidente do órgão, André Gelfi, foi direto sobre o que é necessário ser feito para evitar, ou ao menos diminuir, novas situações como esta que o esporte mais popular do país está vivendo.
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Além disto, ele também reveloumelhorcasa de apostadetalhes como as casas de apostas e seus operadores desconfiam de possíveis manipulações e esquemas.
Vale lembrar que o futebol brasileiro está sob investigação do Ministério Público de Goiás (MP-GO), que segue a todo vapormelhorcasa de apostaseu trabalho, até aqui com as operações Penalidade Máxima I e II.
A Justiça já acatou a denúncia e tornou réus 16 pessoas, sendo sete delas jogadores profissionais (veja lista abaixo).
A investigação apura um esquema envolvendo atletas e grupos criminosos que ganhavam dinheiro com apostas relacionadas a lances específicosmelhorcasa de apostapartidas das Séries A e B do Campeonato Brasileiro de 2022, além de jogos de torneios estaduais de 2023.
É neste imbróglio que estão as casas de apostas, que têm sido o 'campo de jogo' de criminosos para a tentativa de ganho de dinheiro de forma ilícita.
Para Gelfi, não há outra maneira, é preciso haver a regulamentação das apostas no país, o que classificou como "fundamental".
E acrescentou que "educação" e "conscientização" são os melhores caminhos para o combate às manipulações.
"A regulamentação é fundamental para que a gente possa ter controles efetivos.
Não é inventar a roda.
Sabemos como fazer isso.
A nossa posição como instituto é facilitar que isso exista no Brasil.
Existir um mercado controlado.
Como a gente vai controlar um mercado internacional? A gente tem que tratar deste problema na causa e não na consequência", afirmou o diretor-presidente do IBJR.
"A gente tem que esclarecer e explicar como funciona essa dinâmica criminosa e onde as casas estão relacionadas com isso.
Precisamos avançar com as medidas propositivas.
Estamos falando de um mercado que está para ser regulamentado.
Existem maneiras que fazem com que algumas atividades sejam coibidas", seguiu.
E a regulamentação?
Na última quinta-feira (11), o governo federal divulgou detalhes a respeito da proposta regulamentadora para o mercado de apostas esportivas, criada pelo Ministério da Fazenda.
De acordo com a pasta, as empresas serão taxadasmelhorcasa de aposta16% da receita obtida.
Já os ganhadores das apostas pagarão 30% de imposto de rendamelhorcasa de apostacima do dinheiro recebido.
Haverá isenção apenas para valores inferiores a R$ 2.112,00.
De acordo com Fernando Haddad, ministro da Fazenda, o governo federal espera arrecadar entre R$ 12 e R$ 15 bilhões por ano.
O projeto chegará como Medida Provisória ao Congresso.
Assim que for editado, o projeto deverá entrarmelhorcasa de apostavigormelhorcasa de apostaum período de até quatro meses.
A regulamentação ganhou força depois que a Operação 'Penalidade Máxima II' apontou novos nomes de atletas e intermediadores que participaram de manipulações esportivas no futebol brasileiro.
Para Gelfi, a regulamentação, além de criar um "ecossistema" de segurança para os apostadores, também ajudará a proteger os esportistas no futuro.
"A partir de então [da regulamentação], facilitar o trabalho preventivo.
Isso passa por educação.
Estamos alinhados com o que foi discutido com as autoridades brasileiras de regulamentação das apostas, temos que ter a conscientização.
O esportista está vulnerável.
O nosso papel é acelerar esse processo de conscientização", finalizou.
O que leva uma casa de apostas a desconfiar de uma manipulação?
À ESPN, André Gelfi explicou ainda como funciona o trabalho dos operadores de empresas de apostas na identificação de possíveis esquemas de manipulação de resultados.
Trabalho essencial e inicial para ajudar a combater o ganho de dinheiro de maneira ilícita por parte do apostador.
"A gente tem um histórico e movimenta cada aposta.
E temos um padrão de comportamento.
Uma base histórica de cada cliente.
Se o cliente é novo, olhamos com mais cuidado", começou.
"Quando você tem um indício numa casa de aposta, a princípio é só um indício.
Se ele [indício] aumenta, passa a ser uma evidência.
E essas evidências são notificadas.
E daí para frente, é notificado para Fifa ou Uefa, dependendo do esporte", detalhou o responsável pelo IBJR.
"Os operadores, se identificam um movimento estranho, notificam, e a aposta pode ser retirada.
Isso tudo está previsto.
Do ponto de vista técnico, é factível.
Podemos bloquear as apostas.
Isso é o que você faz quando identifica antes do fato acontecer.
Às vezes, você suspeita que algo ocorreu e existe uma investigação", finalizou.
Quantas empresas de apostas fazem parte do IBJR?
O Instituto Brasileiro de Jogo Responsável representa nove grupos que têm empresas atuantes no mercado de apostas.
São eles:1 - Bet3652 - Betsson Group3 - Betway Group
4 - Entain (SportingBet)
5 - Flutter (Betfair)6 - KTO Group7 - Netbet Group8 - Rei do Pitaco
9 - Yolo Group (Sportsbet.io)
Quantos clubes da Série A do Brasileirão têm empresas de apostas como patrocinador máster?
Dos 20 clubes que compõem a primeira divisão do futebol brasileiro, 12 deles contam com companhias de apostas como patrocinadores máster.
Veja a lista abaixo:
Veja abaixo quais são os jogos que estão sob investigação na Série A
Quais jogadores estão sendo investigados?
Eduardo Bauermann (Santos)
Gabriel Tota (Ypiranga-RS)
Victor Ramos ( Chapecoense )
Igor Cariús ( Sport )
Paulo Miranda (Náutico)
Fernando Neto (São Bernardo)
Matheus Gomes (Sergipe)
Quais jogadores também foram citados no processo?
Vitor Mendes ( Fluminense )Richard (Cruzeiro)
Nino Paraíba (América-MG)
Dadá Belmonte (América-MG)
Kevin Lomonaco (Red Bull Bragantino)Moraes Jr.(Juventude)
Nikolas Farias (Novo Hamburgo)
Jarro Pedroso (Inter de Santa Maria)Nathan (Grêmio)
Pedrinho (Athletico-PR)
Bryan García (Athletico-PR)
Apostadores e membros da organização
Bruno Lopez de Moura
Ícaro Fernando Calixto dos Santos
Luís Felipe Rodrigues de Castro
Victor Yamasaki FernandesZildo Peixoto Neto
Thiago Chambó Andrade
Romário Hugo dos Santos
William de Oliveira Souza
Pedro Gama dos Santos Júnior
O que a "Operação Penalidade Máxima" investiga
A investigação da "Operação Penalidade Máxima" aponta que grupos criminosos convenciam jogadores, com propostas que iam até R$ 100 mil, a cometerem lances específicosmelhorcasa de apostapartidas e causassem o lucro de apostadoresmelhorcasa de apostasites do ramo.
Um jogador cooptado, por exemplo, teria a "função" de cometer um pênalti, receber um cartão ou até mesmo colaborar para a construção do resultado da partida - normalmente uma derrota demelhorcasa de apostaequipe.
As primeiras denúncias ouvidas pela operação surgiram no fim de 2022, quando o volante Romário, então jogador do Vila Nova (GO), aceitou R$ 150 mil para cometer um pênalti contra o Sport,melhorcasa de apostapartida válida pela Série B do Brasileiro.
Na ocasião, o atleta embolsou R$ 10 mil imediatamente e só ganharia o restante caso o plano funcionasse.
Romário, porém, sequer foi relacionado para a partida, o que estragou a ideia.
A história chegou até Hugo Jorge Bravo, presidente do time goiano e também policial militar, que buscou provas e as entregou ao Ministério Público do estado.
A partir daí, criou-se a operação "Penalidade Máxima" para investigar provas e suspeitas sobre o assunto.
Na primeira denúncia, havia a suspeita de manipulaçãomelhorcasa de apostatrês jogos da Série B, mas os últimos acontecimentos levaram os investigadores a crer que o problema era de âmbito nacional e havia acontecidomelhorcasa de apostacampeonatos estaduais e também na primeira divisão do Brasileiro.
Além de Romário, outros sete jogadores foram denunciados pelo Ministério Público por participarem do esquema de fabricação de resultados: Joseph (Tombense), Mateusinho (ex-Sampaio Corrêa, hoje no Cuiabá), Gabriel Domingos (Vila Nova), Allan Godói (Sampaio Corrêa), André Queixo (ex-Sampaio Corrêa, hoje no Ituano), Ygor Catatau (ex-Sampaio Corrêa, hoje no Sepahan, do Irã) e Paulo Sérgio (ex-Sampaio Corrêa, hoje no Operário-PR).
Algum jogador de futebol foi preso?
Nenhum jogador preso, só pessoas envolvidas nos pedidos de manipulação.
Foram três mandados de prisãomelhorcasa de apostaSão Paulo, mas só para não atletas.
Foram apreendidas granadas de efeito moralmelhorcasa de apostaum mandado de prisãomelhorcasa de apostaSão Paulo a armas de fogomelhorcasa de apostaoutro endereço, tambémmelhorcasa de apostaterras paulistas.
Nesse local, houve também um flagrante de armas de fogo sem o devido registro.
Os atletas ou aliciadores podem ser indiciados via Estatuto do Torcedor e também podem responder por crime por lavagem de dinheiro, se for o caso.
Segundo o Estatuto do Torcedor, a pena varia de 2 a 6 anos de prisão.
O que os jogadores faziam para manipular as partidas?
Os atletas e envolvidos suspeitos estão sendo investigados por manipulação da seguinte forma: receber cartões amarelo ou vermelho, cometer um pênalti, garantir uma derrota parcial no 1º tempo, número de escanteios, etc.