O que explica o futebol ser um dos esportes mais populares entre mulheres nos EUA
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Author, Alessandra Corrêa
Role, De 🫦 Washington para a BBC News Brasil4 agosto 2023
No esporte mais popular do mundo, os Estados Unidos ocupam uma posição curiosa.
Enquanto 🫦 o futebol masculino do país nunca chegou ao topo e nem consegue gerar tanta empolgação quanto modalidades como o futebol 🫦 americano, o beisebol ou o basquete, estrela bet avião seleção feminina é uma potência que há décadas domina o ranking mundial.
Se na 🫦 maioria dos países o futebol ainda é considerado por muitos um reduto masculino, nos Estados Unidos é diferente.
O futebol sempre 🫦 foi visto mais como um esporte feminino e é um dos mais populares entre as mulheres no país, ao lado 🫦 de atletismo, vôlei e basquete.
"O futebol não se encaixa necessariamente no tipo americano de hipermasculinidade, diferentemente do que ocorre no 🫦 resto do mundo", diz à BBC News Brasil a especialista em futebol Eileen Narcotta-Welp, professora de Ciência do Esporte na 🫦 Universidade de Wisconsin, em La Crosse.
Ela ressalta que, nos Estados Unidos, são esportes como o futebol americano que representam essa 🫦 masculinidade.
"Isso deixou uma abertura para que as mulheres pudessem jogar futebol, porque era considerado menos masculino", salienta.
Mas a popularidade do 🫦 futebol feminino no país, e a dominância de estrela bet avião seleção no cenário mundial, não ocorreram por acaso, e são fruto 🫦 de uma série de fatores históricos, culturais e políticos, entre eles a luta por igualdade de gênero.
Pule Podcast e continue 🫦 lendo Brasil Partido João Fellet tenta entender como brasileiros chegaram ao grau atual de divisão.
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No início da 🫦 década de 1970, quando países como o Brasil ainda proibiam a prática do futebol feminino, os Estados Unidos adotaram uma 🫦 lei federal que ficou conhecida como Title IX (Título IX).
Essa lei, sancionada pelo então presidente Richard Nixon em 1972, proibia 🫦 "discriminação com base em sexo" na educação.
O foco original não era especificamente o esporte, e a lei englobava qualquer programa 🫦 ou atividade de educação que recebesse financiamento federal.
O objetivo era impedir que meninas e mulheres sofressem discriminação em instituições de 🫦 ensino e garantir que tivessem igualdade de oportunidades.
Mas logo o impacto começou a ser sentido nos esportes e, especificamente, no 🫦 futebol feminino.
Para cumprir a lei, escolas e universidades foram obrigadas a reduzir as discrepâncias vigentes na época e a garantir 🫦 que meninas e mulheres tivessem o mesmo tipo de acesso à prática de esportes oferecido a estudantes do sexo masculino.
Nesse 🫦 contexto, o futebol despontou como uma maneira de se adaptar às mudanças.
O grande número de atletas nos times, com 11 🫦 jogadores, além dos reservas, facilitava a inclusão de mais meninas e mulheres.
Além disso, a prática exigia apenas um campo, uma 🫦 bola e balizas, o que representava uma opção de baixo custo para as instituições de ensino.
"Para os diretores esportivos, fazia 🫦 muito sentido, tanto em termos de números quanto de recursos", afirma Narcotta-Welp, que durante dez anos atuou como técnica de 🫦 futebol em times de diferentes universidades americanas.
Crédito, Getty Images Legenda da foto, Seleção dos EUA está classificada para as oitavas 🫦 de final da Copa do MundoCrescimento
A lei foi inicialmente recebida com resistência por parte das instituições de ensino e da 🫦 Associação Atlética Universitária Nacional (NCAA, na sigla em inglês), responsável pelos programas de esportes nas universidades do país.
No entanto, nos 🫦 anos seguintes as escolas acabaram tendo de aceitar e começaram a se adaptar, e a partir da década de 1980 🫦 os resultados começaram a ficar mais visíveis.
O incentivo e as oportunidades para que meninas e mulheres praticassem futebol levaram a 🫦 uma explosão no número de estudantes dedicadas ao esporte em escolas, universidades e clubes do país.
Em 1971, um ano antes 🫦 de a lei entrar em vigor, apenas 700 alunas do Ensino Médio nos Estados Unidos praticavam futebol, segundo dados da 🫦 Federação Nacional das Associações Estaduais de Ensino Médio.
Vinte anos depois, em 1991, quando foi realizada a primeira Copa do Mundo 🫦 de futebol feminino, esse número havia saltado para mais de 121 mil.
No ano passado, eram 375 mil.
No nível universitário, a 🫦 temporada de 1971-1972 tinha apenas 313 jogadoras, segundo dados da NCAA.
Dez anos depois, eram 1.
855 atletas do sexo feminino em 🫦 80 times.
Atualmente, são 28 mil jogadoras em mais de mil times.
No caso das universidades, um avanço importante desde a implementação 🫦 da lei também foi o número equivalente de bolsas de estudos oferecidas a atletas de ambos os sexos, o que 🫦 abriu caminho para que muitas mulheres pudessem usar seu talento nos esportes e, especificamente, no futebol, para obter acesso ao 🫦 ensino superior.
"A oportunidade de jogar futebol universitário e ganhar uma bolsa de estudos também foi um empurrão para o futebol 🫦 feminino, sem falar no sucesso da seleção feminina dos Estados Unidos em campo", ressalta Narcotta-Welp.
Hoje, mais de 50 anos após 🫦 ter entrado em vigor, a lei beneficiou gerações de atletas e é considerada um exemplo de sucesso no desenvolvimento do 🫦 esporte feminino.
O investimento nesse esporte gerou um enorme banco de talentos, de onde as melhores acabam na seleção americana.
Crédito, Getty 🫦 Images Legenda da foto, Fãs da seleção feminina de futebol dos EUA durante a Copa do Mundo de 2023Proibição
Mas a 🫦 liderança dos Estados Unidos no futebol feminino não é resultado exclusivo da lei.
Narcotta-Welp observa que, enquanto a lei afetou apenas 🫦 instituições de ensino, o futebol vinha ao mesmo tempo conquistando outros locais, como clubes e espaços comunitários.
"Pais e mães viam 🫦 o futebol como um tipo de esporte não violento, ao contrário do futebol americano", afirma Narcotta-Welp.
"Houve um aumento no número 🫦 de meninas praticando futebol, porque era considerado um esporte mais igualitário, que todos podiam jogar."
Outros fatores também contribuíram para a 🫦 dominância americana, inclusive as décadas de negligência ou até mesmo de proibição do esporte em outros países, sob a justificativa 🫦 de que seria prejudicial à saúde ou à fertilidade das mulheres.
No Brasil, as mulheres foram proibidas de praticar futebol por 🫦 quase quatro décadas, devido a uma lei que vigorou de 1941 a 1979.
O futebol feminino só foi regulamentado no país 🫦 em 1983.
Na Inglaterra, jogos de futebol feminino foram banidos por meio século, a partir de 1921.
A Alemanha proibiu o futebol 🫦 feminino profissional de 1955 a 1970.
Assim, enquanto nos Estados Unidos meninas tinham oportunidade de jogar e recebiam treinamento desde jovens, 🫦 proibições nesses e em vários outros países resultavam na falta de incentivo e investimentos no futebol feminino.
Vitórias
A seleção dos Estados 🫦 Unidos foi formada em meados da década de 1980 e, quando a primeira Copa do Mundo de futebol feminino foi 🫦 realizada, em 1991, na China, a equipe americana foi a campeã, batendo a Noruega.
Essa vitória, apesar de comemorada pelos torcedores 🫦 mais atentos, não gerou muita atenção nos Estados Unidos.
Cinco anos depois, os Jogos Olímpicos de 1996, realizados em Atlanta, foram 🫦 os primeiros a incluir o futebol feminino, e a seleção americana conquistou a medalha de ouro, vencendo a China.
A equipe 🫦 campeã contava com jogadoras como Mia Hamm, que durante anos foi o retrato do futebol feminino no país.
Mas foi somente 🫦 na Copa do Mundo de 1999, realizada nos Estados Unidos, que a seleção americana consolidou estrela bet avião popularidade com o público.
Na 🫦 partida final, a equipe venceu a China nos pênaltis, diante de um estádio lotado com 90 mil pessoas e mais 🫦 de 40 milhões de espectadores pela TV.
Segundo Narcotta-Welp, se para quem já acompanhava futebol de perto o ponto de virada 🫦 ocorreu com a vitória na copa de 1991, para o público leigo o marco foi 1999.
Além de Mia Hamm, a 🫦 seleção de 1999 transformou em estrelas outras jogadoras, como Brandi Chastain e Michelle Akers.
Muitas atraíram publicidade e o patrocínio de 🫦 marcas famosas, como Nike, e passaram a ser idolatradas por meninas em todo o país, que sonhavam com uma carreira 🫦 no futebol.
Crédito, Getty Images Legenda da foto, A equipe dos EUA antes da final do futebol feminino nas Olimpíadas de 🫦 Sydney, na Austrália, em 28 de setembro de 2000.
A Noruega venceu por 3 a 2
Nos anos seguintes, a equipe americana 🫦 venceu mais duas copas do mundo, em 2015 e 2019.
O resultado é ainda mais impressionante quando se considera que a 🫦 copa feminina atual é apenas a nona a ser realizada.
Os Estados Unidos venceram metade dos oito campeonatos anteriores.
O futebol feminino 🫦 do país também levou ouro em outras três olimpíadas (2004, 2008 e 2012), além de várias vitórias em campeonatos diversos.
A 🫦 liderança da seleção americana como número um do mundo, no topo do ranking da Fifa, contrasta com o desempenho da 🫦 equipe de futebol masculino, que ocupa a 11ª posição e nunca venceu uma Copa do Mundo.
Mas mesmo com essa superioridade, 🫦 as mulheres passaram anos sendo pagas bem menos do que os jogadores do sexo masculino e enfrentando outras desigualdades em 🫦 diversos aspectos, desde a qualidade das acomodações em viagens até condições gerais de jogo.
Foi somente em 2022 que as jogadoras 🫦 conquistaram igualdade de salários, depois de processarem a Federação de Futebol dos Estados Unidos e obterem um acordo sem precedentes 🫦 no valor de US$ 24 milhões.
Segundo Narcotta-Welp, apesar do resultado positivo, ainda é incerto o impacto dessa vitória para jogadoras 🫦 que não estão no topo.
"Tenho certeza de que algumas desigualdades irão permanecer", afirma.
Crédito, Getty Images Legenda da foto, Seleção dos 🫦 EUA com a medalha de ouro da Olimpíada de Londres, em 2012Futuro
A trajetória de mais de três décadas de sucesso 🫦 no futebol feminino dos Estados Unidos gerou impacto no esporte ao redor do mundo.
Jogadoras de vários países buscam treinar e 🫦 jogar em universidades e clubes americanos.
Uma análise do jornal USA Today calcula que, entre as 32 seleções que participam da 🫦 atual Copa do Mundo, 27 têm jogadoras com algum tipo de ligação com os Estados Unidos.
O jornal cita entre elas 🫦 a brasileira Marta, que joga no Orlando Pride, da Flórida, e já passou por outros clubes no país.
Recentemente, outros países 🫦 vêm recuperando o tempo perdido, com maior interesse e investimento no esporte, o que pode representar desafios para os Estados 🫦 Unidos.
No ranking mais recente da Fifa, o país é seguido por Alemanha, Suécia, Inglaterra e França.
A seleção brasileira aparece em 🫦 oitavo lugar.
Narcotta-Welp salienta que, enquanto nos Estados Unidos, o futebol universitário continua sendo o destino natural de atletas que começam 🫦 a praticar o esporte na escola, países como Alemanha ou França estão identificando talentos mais cedo e colocando essas jogadoras 🫦 diretamente em ligas profissionais.
"Creio que há atualmente uma tentativa de fazer essa transição (nos Estados Unidos)", diz.
"Acho que vamos começar 🫦 a ver mais e mais jogadoras pulando a universidade para jogar (diretamente) na liga profissional", aposta.
A professora acredita que o 🫦 atual momento é de "uma nova ordem mundial" no futebol feminino.
Ela prevê que a seleção americana deve continuar entre as 🫦 principais do mundo, mas adverte que outras equipes estão ficando cada vez melhores.