A Federação Internacional de Natação (Fina) anunciou uma nova política que restringe a participação de mulheres trans em modalidades aquáticas.
A 6️⃣ regra, que foi o maior banimento de pessoas trans da história do esporte, entrou em vigor em junho desse ano 6️⃣ e barrou a participação em eventos internacionais de mulheres trans que passaram pela puberdade masculina ou completaram a novibet casino guru transição 6️⃣ após os 12 anos de idade.
A Fina mudou a novibet casino guru orientação após os votos de 71% das 152 nações federadas 6️⃣ em Budapeste, seguindo o painel científico da entidade que relatou que mulheres trans manteriam uma vantagem competitiva significativa sobre mulheres 6️⃣ cis.
A solução proposta foi a criação de uma nova categoria "aberta" em que pessoas trans poderiam competir.
A decisão trouxe à 6️⃣ tona a discussão sobre quais são – se é que existem – os limites entre inclusão e competição justa no 6️⃣ mundo dos esportes.
O que diz a ciência?
Homens e mulheres têm desempenhos físicos em força e agilidade bastante diferentes, em grande 6️⃣ parte devido à testosterona.
Na puberdade masculina, a testosterona aumenta a massa muscular, densidade óssea, altura e tamanho dos membros, além 6️⃣ de produzir mudanças no coração, pulmões e no sangue, fatores que contribuem significativamente para performance esportiva.
Estima-se que atletas masculinos tenham 6️⃣ um desempenho de 30 a 100% maior que as modalidades femininas.
Teoricamente, mulheres trans que passaram pela puberdade masculina manteriam parte 6️⃣ dos benefícios da testosterona.
Alguns deles, como estatura e tamanho de mãos e pés, não se revertem após a transição hormonal 6️⃣ ou cirúrgica.
A hipótese de que elas teriam vantagens se choca, no entanto, com níveis baixos de testosterona altos de estrogênio, 6️⃣ classicamente associados a menor desempenho esportivo nas mulheres cis.
Em busca de uma resposta definitiva se haveria alguma vantagem competitiva, diversos 6️⃣ estudos mediram massa muscular e força em mulheres trans até três anos após o início da hormonização.
Eles mostraram uma redução 6️⃣ pequena da capacidade física (entre 10-15% em relação à média) que não reverteria completamente o benefício em relação ao sexo 6️⃣ biológico masculino.
A grande crítica à maior parte desses trabalhos é que eles mediram o desempenho físico em pessoas comuns, com 6️⃣ níveis de treinamento baixo a moderado.
E é complicado extrapolar dados de pessoas comuns para estimar o desempenho de atletas profissionais.
Vários 6️⃣ deles usaram ainda medidas de exercícios isolados (como leg press ou supino) enquanto esportes como natação ou basquete são muito 6️⃣ mais complexos e dependem de outras habilidades.
Levando em conta esses dados, o Comitê Olímpico Internacional (COI) definiu em novembro de 6️⃣ 2021 que "não se deve assumir que uma atleta trans automaticamente tenha uma vantagem injusta nos esportes femininos" e convidou 6️⃣ cada esporte a definir individualmente as suas diretrizes.
Qual o impacto da decisão?
A nova política da Fina exige que as atletas 6️⃣ transitem antes do início da puberdade ou antes dos 12 anos.
Sozinha, essa decisão exclui praticamente todas as atletas trans do 6️⃣ esporte.
A dificuldade de acesso dos jovens trans ao cuidado de afirmação de gênero é um desafio em todo o mundo 6️⃣ e atualmente está em ameaça em diversos estados americanos.
Mesmo no Brasil, a transição é permitida apenas a partir dos 16 6️⃣ anos e só é oferecida no SUS a partir dos 18 anos, o que já excluiria o país de eventos 6️⃣ aquáticos profissionais.
Os critérios da Fina também não protegem as mulheres cis que agora podem ter de passar por testes para 6️⃣ decidir quem é ou não considerada mulher e permitem que mulheres sejam aleatoriamente alvos de exames e testes invasivos, uma 6️⃣ vez que mulheres cis e trans podem ser absolutamente indistinguíveis.
Devemos criar uma terceira modalidade?
A Fina propõe ainda a criação de 6️⃣ uma nova categoria "aberta", para que pessoas trans possam competir, mantendo assim a "equidade" nas modalidades femininas.
Mas ainda um dia 6️⃣ essa categoria se mostre justa, vai ser muito difícil que seja criada.
Do ponto de vista numérico, pessoas trans representam cerca 6️⃣ de 1% da população.
É praticamente impossível criar competições ou manter categorias com esse número.
Isso sem contar o fato de que 6️⃣ em alguns países ser trans é ilegal, o que tornaria o acesso ao esporte ainda mais injusto.
Na prática, a desinformação 6️⃣ e o medo são usados como argumentos para defender competições justas e seguras.
Para muito além dos dados científicos, a realidade 6️⃣ é que mulheres trans não dominam categorias ou competições.
Nenhuma nadadora trans já competiu ou compete em nível olímpico.
Desde que a 6️⃣ política do COI para atletas trans foi instituída em 2003, mais de 63.
000 atletas chegaram ao nível olímpico.
Desses, apenas 2 6️⃣ mulheres trans e nenhuma ganhou uma medalha.
Essa política coloca ainda em cheque o quanto acreditamos na capacidade das atletas femininas 6️⃣ ao não reconhecer que a diversidade de corpos que já existe entre mulheres cis, que diferem em altura, peso, força, 6️⃣ velocidade e agilidade, e até mesmo em níveis de testosterona.
Aqui no Brasil, o caso de Tiffany Abreu (mulher trans) do 6️⃣ vôlei feminino foi muito emblemático.
Apesar de muita discussão quando mudou para o vôlei feminino, seu desempenho por vezes foi inferior 6️⃣ ao de outras jogadoras cis de destaque dos últimos anos.
A resposta está além da ciência?
A ciência a respeito de pessoas 6️⃣ trans no esporte está apenas no começo e respostas definitivas certamente levarão mais de 20 anos para surgir.
O que os 6️⃣ órgãos regulatórios dos esportes devem saber é que, qualquer política que seja criada agora estará sujeita a mudanças nos próximos 6️⃣ anos.
O universo esportivo nunca foi aberto a diversidade e o debate atual traz luz ao fato de que pessoas trans 6️⃣ estão cada vez mais presentes em todos os espaços.
É claro que quando falamos de esportes profissionais, em que os competidores 6️⃣ dedicam carreiras inteiras atrás de resultados, diferenças de segundos podem ser decisivas e qualquer vantagem pode tornar a competição injusta.
A 6️⃣ chave para essa discussão pode não estar na medicina do esporte, e sim na sociologia e direitos humanos.
Para atletas trans, 6️⃣ ser quem são é indissociável do esporte que pratiquem.
A pessoa não pode escolher não ser trans para competir, e não 6️⃣ é justo que não possa competir simplesmente por ser quem é.
Quando falamos em esportes profissionais, pode ser difícil ter o 6️⃣ máximo de inclusão, segurança e igualdade de condições ao mesmo tempo.
É possível que tenhamos que escolher algum ponto entre eles.
Agora, 6️⃣ se isso será de fato necessário, em todos os esportes ou apenas alguns, só mesmo o tempo responderá.
Henrique Cardoso Cecotti 6️⃣ é endocrinologista
Fonte: Coluna Jairo Bouer no UOL